domingo, 30 de outubro de 2016

Canção do fim



“...Eu escavo, tu escavas, e o verme também escava,
e quem canta ali diz: eles escavam.”
Paul Celan


Uma coisa é uma coisa, todo sexo é um começo,
Coisa que começa, que inicia tem um fim,
O começo do desejo é o fim do começo,
Todo fim é o início de um novo desejo.
Palavra inventiva: é só o começo.
Depois eu te inicio, entre o fim e o meio,
Depois de todo o meio, o fim é um belo beijo.
No começo se inicia o fim, um fim esplendoroso,
O rosto é começo, o olhar é o espelho,
Depois dos corpos, o vento é o que mistura,
Os dois se perdem na multidão,
O breviário das bocas, alcance do desejo,
A flor da vida testemunha o enlace,
A dor é a separação, nunca mais ouvir a voz,
O instante da partida é a rusga da boca aveludada.




sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Outubro



Outubro, choveu tanto este mês,
Outubro fiz aniversário, sol no fim de tarde,
Outubro é primavera, fiz meus olhos ficarem verdes,
Tive tempo de deixar vermelho meu pensamento,
Fui até o espelho e vi o vulto da velhice dançando,
Meu corpo é um rio temperado de cumplicidade com a vida.

Vou sair para ver o rio transbordar, santuário de águas,
Vou ouvir o canto do sabiá antes do dia se apresentar,
Outubro, eu entre os librianos, é o som da rua,
O ladrão que esconde a chuva para não se molhar,
O político que é preso para o tempo ser ultrapassado.
Outubro, política da violência que discorre - dia e noite.

Outubro é o mês do Cartola e de Vinicius.
Em outubro a dor passa mas não descansa,
A música é sumo nos lábios, entoa qualquer saída,
Viver é a facilidade de todas as notas do pensamento.



sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Cartografia da Educação

    Gustav Klimt



Torna-se patente hoje o fato de que as construções modernas de uma razão subjetiva não eram menos utópicas do que as visões antigas e medievais de uma razão objetiva. Pois a razão subjetiva não é outra coisa senão um sujeito universal coerente.

Peter Sloterdijk (Crítica da Razão Cínica)



Tenho medo de um país mais adiante, do país que vivo, ali na frente é na certa o naufrágio de um pôr do sol. Como tinha medo do país presente, melhor de um passado sem registros é o de conhecimento. É preciso que saiamos do legado moderno. Tenho este temor diante das cabeças em minha frente, o controle da ordem é a origem do pensamento, pois refletir nas certezas nos levaria ao racionalismo, nos poria no centro das discussões. Não é o que parece, é o que vem acontecendo, cada vez mais o pensamento está sendo eivado pela brutalidade da lógica silenciosa de excluir o máximo possível, de colar o mínimo com mais força para poder fazer da realidade um acordo entre o que está disponível e a única coisa que pode ser dada. Ou seja, contestar sem arejar o cérebro. Não se trata de buscar o culpado, pois se fosse mexer neste presente existente, o passado estaria sendo esquecido para sempre.

Um lugar ao sol para os que acreditam que pensar é um bem supremo. Desde que o contrário da ordem oferecida não seja a não aceitação de mais um esboço de encobrir o presente com a funcionalidade das ordens injetadas para solucionar a doença maior que existe, a falta de conseguir religar os fios dos pensamentos. Nos iludimos muito rapidamente com as ordens, nos deprimimos mais rápido com a crítica, porque certamente o que já está sendo proposto é melhor, está pronto, já vem como uma forma vitoriosa. Os críticos da Educação são os mesmos que outrora gostavam de pensar um meio de socializar, mas esquecem, hoje, o pensar dentro de um limite é inócuo. Pois o pensar não é uma racionalidade pronta, não tem uma fórmula de inclusão do melhor em detrimento do que já está excluído por ter sido uma ameaça aos propósitos dessa suposta socialização da Educação.


Existem fórmulas para aplicar na educação, mas não há uma maneira inabalável de que essas receitas possam dar certo sem que haja, o que pouco resta de um pensar autônomo, um grande desastre no presente. Não estou a pensar no futuro, mas em refletir sobre o que estão pensando em fazer, do hoje, um amanhã mais formatado, mais indecifrável, porém, funcionalmente mais seguro.   


sábado, 8 de outubro de 2016

Passagem

    Imagem do portal libertarianismo




Não dou conselho, viro a página do livro,
Não vendo meus pertences, anulo meu sofrimento,
Não compro drogas com código de barras, não voto na salvação,
Não compro a alma de ninguém, não vendo meu coração,
Alhures farei meu país, não jogo o jogo dos algozes,
Não saio com bandeiras, minha luta é a paz,
Não me iludo com promessas, minha pátria não tem dono.


Passagens

        Brassaï - Pont Neuf, Paris (1949)     “ As ruas são a morado do coletivo.” Walter Benjamin “Na praia, o homem, com os braços cru...